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SUAS CAPACIDADES

Projeção de futuro

Essencial para sobreviver, mas se não for bem usada...

Eu tive que fazer um exame de sangue. No momento em que decidi ir para o laboratório, percebi uma sensação em meu braço, na parte interna do cotovelo. Então notei que estava imaginando como seria, alguém enfiando uma agulha de injeção no local, e eu estava sentindo alguma dor! E isto aconteceu todas as vezes que eu me lembrei de que iria ter o sangue coletado.

O que torna isto possível? É porque nós temos a capacidade de projetar o futuro, e tomar decisões baseadas no que imaginamos e como reagimos ao que imaginamos. Quando vamos a um restaurante self-service, temos também de pensar dessa forma. Comer aquele prato vai ser bom ou saudável? Provavelmente você se imagina comendo e avalia pelo que imagina.

A capacidade de projetar o futuro é essencial para nossa sobrevivência. É uma forma de avaliar as conseqüências de nossas possíveis ações. Pense, por exemplo, quando você está bravo e tem vontade de bater em alguém. Talvez você não faça isto porque projeta mentalmente que vai se machucar. Ou que a outra pessoa sairá machucada, e pode não querer mais ser seu amigo ou cônjuge. Ou se for seu chefe, você vai perder seu emprego (e a menos que queira perder o emprego, vai se conter!).  

Meu cachorro (o mesmo cachorro que mudou o mundo) tem essa capacidade em algum grau. Se ele ouvir  a palavra mágica "passear", ele dispara a pular de um lado para o outro na maior ansiedade. E mais: ao brincar com ele com uma das mãos, percebi outro aspecto dessa capacidade. Eu rodava o braço e ele também rodava tentando morder a mão. A certa altura, ele não acompanhou a mão, e sim se dirigiu para o ponto onde a mão iria estar pouco depois (como fazemos ao pegar uma bola em movimento).

Assim, projetar o futuro é uma capacidade muito útil, tanto que a usamos todo o tempo. Mas como todo processo interno, o modo como é usado pode não ser tão útil. Por exemplo, você é convidado para jantar e, quando vê a comida, nota que o prato principal é um que você não gosta. Você se imagina comendo a comida, verifica que você não gosta dele e educadamente se recusa a comer. Mas o que você não sabe é que o prato é uma nova receita da dona da casa, cujo sabor é diferente de tudo que você já comeu. O padrão que você identificou em sua experiência não se aplica neste caso. Desta vez, você perde algum prazer (ou deixa de ganhar, já que não pode perder algo que nunca teve).

A projeção de futuro é um dos processos mentais que podem participar da ansiedade. Como alguém consegue ficar ansioso enquanto tudo ao seu redor está bem? Ele pode estar reagindo a alguma projeção que está fazendo do cenário atual. Por exemplo, uma turma de uma escola faz uma abaixo-assinado para tirar um professor, e este fica ansioso. Não com o abaixo-assinado, já que nada aconteceu ainda, mas com a possibilidade futura de que ele seja demitido por causa disto. Uma pessoa que está com medo de altura pode estar fazendo repetidamente uma projeção inconsciente de que está caindo, e está reagindo a isto como se fosse iminente. Tem um caso de Richard Bandler, um dos criadores da Programação Neurolingüística (PNL), sobre uma moça que fazia exatamente isto. Ele curou-a fazendo com que ela se aproximasse da janela alta entoando mentalmente o Hino Nacional, mudando sua estratégia interna. Neste caso talvez fosse mais apropriado chamar o processo de "projeção de presente", já que a pessoa imagina e reage como se estivesse acontecendo.

E quando você imagina o futuro, que aspecto está enfocando? Se for convidado para uma posição de liderança, talvez você enfoque só a parte (que julga) ruim. Se tiver uma oportunidade para trabalhar como um professor e você enfoca o preenchimento de pautas, você dirá não. Mas se você pensar sobre o que pode fazer pelos estudantes, e projetar o futuro deles com ou sem você, poderia ficar muito motivado, se acredita no próprio trabalho. Será ainda melhor se você projetar tudo o que vai fazer, dar e receber, e fazer uma avaliação geral de custo-benefício, de forma integrada com seus demais objetivos.

O estado da arte de projetar o futuro talvez seja quando você projeta, avalia e, se não gostar, procura por alternativas para fazer mudanças que o levem aonde quer. Você já faz isto quando dirige. Se vir um pedestre, faz uma projeção do que ele ou ela fará. Se concluir que seu veículo e o pedestre vão colidir, você vai frear, desviar ou talvez até acelerar para passar antes do pedestre (se, claro, sua intenção é qualquer outra coisa que não acertá-lo!). Note sua capacidade: como motorista, projeta o que pode acontecer com os pedestres, os outros carros e o que estiver se movendo no seu caminho. Já como pedestre, tem que projetar o seu movimento e o dos carros para decidir se pode atravessar ou não. Se na sua imaginação há possibilidade de colisão, você espera. Já se gosta de viver perigosamente... Note também como o objetivo afeta a decisão: se alguém quer se jogar na frente de um carro, seus critérios serão diferentes.

Mas onde estão esses “filmes” que nem sempre vemos? De fato, há um outro elemento dessa capacidade de projeção. Você está tão treinado e faz tão rápido que nem presta atenção, tornando o processo inconsciente. E nem precisa conhecer os detalhes internos do processo; esta é uma característica das coisas que fazemos bem, como andar ou falar. Você é competente inconsciente nisto. E tem mais. Uma situação já avaliada pode mudar, o que exige atualizar a projeção com as novas informações. E, como no exemplo do trânsito, você pode fazer isto na velocidade do pensamento, talvez várias vezes por segundo!

Como esse conhecimento pode ser útil? Primeiro, sempre poderemos questionar “Será isto mesmo?” e buscar o feedback da experiência. Por exemplo, será que comer brócolis é tão ruim? Quem sabe misturado com arroz ou com maionese. Será que perdoar é tão humilhante, ou pode ser algo bom? Algumas coisas serão ruins mesmo, mas outras não. Quando eu fui para o laboratório, eu estava com medo. Mas resolvi olhar e sentir o que estava acontecendo bem no momento da coleta, isto é, queria algum feedback. Verifiquei então que havia dor, mas não tanta, e eu podia olhar para o sangue sem problemas, enquanto conversava com a enfermeira. Agora, quando eu penso em ir para o laboratório, não me incomoda tanto. Hoje como brócolis e outras verduras porque um dia desafiei minhas projeções.

Segundo, por mais que gostemos de ter certeza do futuro,  devemos admitir que não podemos prever tudo, e o inesperado pode ser às vezes bem agradável!

Terceiro, seja para aquelas projeções que fazemos bem ou para aquelas que nos fazem perder oportunidades, e já que o futuro é apenas probabilidade, a qualquer momento podemos imaginar outras possibilidades e conseqüências, enriquecendo nossas decisões. E quando a projeção não nos agradar, sempre poderemos intervir no fluxo da vida, através da nossa inteligência e nossa ação, para conduzir as coisas para algo mais próximo do que queremos.

Virgílio Vasconcelos Vilela

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